quinta-feira, 21 de abril de 2011

Medo




"Medo escorre entre os meus dedos
Entre meus dedos
Eu lambo os dedos e
saboreio meu próprio medo.

(...)

Medo de ter,medo de
perder
Cada um tem os seus e todos têm algum."




O medo tem várias faces e várias funções. Tem o medo propriamente dito,que é aquele que nos alerta em situações de perigo: medo de tiro, medo de altura, medo de choque.Tem o medo doentio,a fobia,como o meu pavor de chuveiros elétricos e o seu a baratas.Tem esse medo de que a música fala,que a gente "lambe os dedos e saboreia":o
medo na montanha russa,no mar quando tá batendo,ao voar na asa delta,saltar de bungee jump; O frio na barriga segundos antes de entrar em cena. Os segundos antes do primeiro beijo. O olho da banca enquanto você é testado.Mas tem o medo que paralisa, que acossa, que oprime. O medo que trava o pensamento,desnorteia,assusta;O medo que esconde as respostas e que faz a coragem desaparecer a ponto de fazer crer que ela jamais existiu.O medo do vilão desconhecido. O medo do tempo voraz e dos sonhos não realizados.
E este é o medo que eu sinto agora.

domingo, 10 de abril de 2011

Poesia viva.

Quem anda pelos centros culturais,museus e outros pontos de divulgação da arte aqui no Rio, certamente já viu alguém vendendo sua arte nas entradas destes locais. Na maior parte das vezes são escritores, que reproduzem com simplicidade seus escritos por meio de xerox e as vendem àqueles que se dispõem a doar um minuto de seu tempo a quem tem algo a dizer.

Na sexta passada,8/04,encontrei um deles na Avenida Rio Branco(Rio de Janeiro,RJ),ali na Cinelândia,aquele lugar que transpira cultura.Chama-se Thiago e é Oliveira como eu.

Eu estava bem chateada,tensa pelos acontecimentos recentes que me abalaram mais do que eu esperava,além de estar apressadíssima,precisando chegar À Ilha do Governador às 18:30,quando já eram 17:30(mal sabia eu que só chegaria às 20-maldito engarrafamento!).Mas ainda assim parei para ouvi-lo.

O poeta me falou de sua arte e me apresentou sua publicação, pedindo que eu colaborasse com quanto achasse necessário. E acrescentou comentários a respeito do quanto se está superfaturando a arte nas livrarias da cidade. Thiago falou mais coisas,que meu cérebro combalido pela dor do inconsciente coletivo (Por assim dizer.Dos milhares que andavam pela rua,eu era a única a vestir preto.) não pôde reter muito, mas sua presença de espírito foi um bálsamo em meu dia. Folheei o material e vi lindos poemas,sensíveis,emotivos,complexos no sentimento porém simples na expressão. E por alguns minutos o meu dia foi feliz, porque um solitário artista me trouxe um pouco de poesia.

Contribuí com um mísero real,que o deixou contente e talvez pague o material usado,mas é nada diante do bem que me fez aquela breve conversa.

E fiquei pensando na beleza que é a pessoa apostar em seu potencial e divulgar sua arte corajosamente na rua levando, como ele disse,mais de cem 'nãos' até conseguir um 'sim'.Ele poderia estar engravatado trabalhando e contentar-se em divulgar sua poesia entre parentes e amigos. Mas seria feliz?

Que bom que ele escolheu outro caminho.Caso contrário,aquele dia não teria nem um minutinho de alento.


***


Eu sou

Cílio solto

No rosto

Do outro.

Pousado,

Descrente.


Eu sou

Cílio solto

Dos outros.

Do olho,

Soltei-me

Contente.


Eu sou cílio solto

Na face da gente

eu peso.

Não sente?


(In "Sobre o ciclo e os organismos"-Publicação independente de poesias e desenhos de Thiago Oliveira,um bardo/ o_bardo1984@hotmail.com)


Jane C. é professora,

escrevedora,

e acredita que a poesia

traz beleza à vida.













quinta-feira, 7 de abril de 2011

Um Rio de dor.

Ainda bem que não acredito em deus. Se eu acreditasse,estaria agora em um dilema terrível. Aquele que assoma o crente quando um fato coloca sua fé à prova,porque simplesmente não há explicação.E o que aconteceu na minha cidade hoje não tem explicação.Não.Ninguém me convenceria de que o que houve aqui aconteceu porque assim deus quis.Se em deus eu cresse,neste momento estaria em crise,imaginando que ser tão cruel nos usa como marionetes e decide permitir que algo assim aconteça. Se a justiça divina existe,quero andar à margem dessa lei.Folgo,então,em não crer,porque posso afirmar que o que aconteceu não pode ser justificado de forma alguma.Não há explicação para uma tragédia que nem o mais pessimista dos cariocas chegou a pensar aconteceria. Mas aconteceu. Por ironia do destino,no bairro citado em uma das mais famosas canções de aclamação ao Rio de Janeiro e um dia após o filme que leva o nome da cidade estrear e cair nas graças da imprensa estrangeira. Pode ser que exista um porquê pra tudo,mas eu não vou entender nem aceitar nunca que aquelas 12 vítimas mereciam o que aconteceu.Não os conheci,não sei nada deles.Talvez fossem daquelas pessoas que vão se confessar e nem sabem o que dizer ao padre.Talvez nem tanto,talvez fossem assanhados ou espertinhos.Bons alunos?Talvez.Os pestes da escola?Quem sabe.A única coisa que sei é que doze vidas foram arrancadas de doze jovens que estavam na hora e no lugar certo,mas foram vítimas de um mundo todo errado,onde o ser humano está cada vez mais desumano. Quando vi o noticiário,demorei alguns minutos para compreender a gravidade do que ouvia.Agora,pareço anestesiada,porque o choque é grande demais.A tragédia é grande demais para ter acontecido-e o chocante é que ela,de fato,aconteceu. Estes jovens foram arrancados da vida da maneira que mais temo:sem adeus,sem preparo,sem resignação dos familiares...Exatamente o tipo de morte que não se enquadra no que escrevi na postagem anterior.Foram para a escola quem sabe com planos para a tarde deste dia.Após o beijo dos pais,sem saber que seria o derradeiro.Para mais um dia de aulas,talvez boas,talvez chatas,mas de fato,parte da vida que tinha todo um futuro. Penso nas palavras de Pitty: não deixe nada pra semana que vem,porque semana que vem pode nem chegar. Mas como prever que a semana que vem não chegaria para pessoas que mal começaram a viver? Ouço as vozes dos sobreviventes no rádio,a maioria ainda com aquele timbre que não passou de menina a moça,de menino a rapaz,e um arrepio me percorre a espinha pensando no quão jovens eram.O choque é grande.Pela tragédia,pelo triste novo,pelo medo de que se repita.Como foi quando Ana Carolina da Costa Lino foi abatida a tiros,e pensamos que era o fim da picada.Não era.Quantas Anas vieram depois?Depois da Ana teve o 174.Foi-se a Geiza.E parecia o fim,não poderia ser pior.Piorou.Teve a Gabriela Prado.E parecia que não ia piorar,porque o que poderia ser pior do que uma jovem adolescente ser abatida na estação do metrô,em sua primeira viagem sozinha?Mas piorou!Porque veio João Hélio,e com ele,o fim da minha fé na humanidade.E crime após crime,parecia que nada mais poderia chocar.Então veio Lavínia.E não era o fim.O fim tem que ser a tragédia de Realengo.Porque se isso não for o fim,por favor,explodam o Rio,porque ele não merece isso.Nós não merecemos.

O Rio de Janeiro escreveu hoje a sua página mais triste e dolorosa.