quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Finitude #2

Era a madrugada de uma segunda-feira.
Naquele domingo,eu arrumara a casa até tarde e o computador permancera ligado por muito tempo me esperando. Já passava de uma hora da manhã,quando finalmente consegui me sentar diante dele para dar aquela última olhada nas redes sociais antes de dormir.
Havia uma janela de MSN acesa.Nela,apenas o meu nome-o segundo,Carla,pelo qual a minha família me trata(e eu prefiro). Era um primo meu,do Ceará, me chamando. O motivo, eu não precisaria perguntar,porque o subnick dele já me informava: "Luto-Minha tia Lúcia".
E assim,eu soube que tinha perdido uma tia muito querida, uma pessoa de quem ouvia falar desde os meus primeiros anos de vida. Aquela que vinha cuidando da minha irmã e da minha mãe,ambas no Ceará,a quilômetros  de distância de mim.
Eu nem sabia que ela estava doente. Naquela madrugada,soube que ela vinha padecendo de um câncer no estômago já havia mais de um ano, mas tinha escondido de quase todos, por 'vergonha'.
E ela tinha ido embora. E eu nunca pude apoiá-la. Eu simplesmente não sabia.
O primeiro impacto foi aquela espécie de anestesia,de quando você simplesmente não processa o que ouviu/no caso,leu. No instante seguinte, o autocontrole adquirido na prática budista fez com que eu tentasse absorver e compreender. Mas quando a cabeça tocou o travesseiro, minhas raras lágrimas vieram, para me mostrar que aquilo tudo era real.
Nestas situações de perda, as lembranças vêm à tona na mesma hora. E assim foi. Lembrei-me de minha única viagem ao Ceará. De como fui bem recebida, e minha tia Lúcia me colocando a par de todos os fatos da família, compartilhando o sonho de vir ao Rio, me mostrando a Praça Cuba, o Teatro Municipal, o Mercado Modelo, o Portal do Arco do Triunfo. Lembrei-me do show do Mastruz com Leite e da expressão engraçada dela ao relatar sobre um pequeno vexame dado pelo meu primo diante do prefeito durante o evento.
Lembrei-me da nossa excursão à praia de Almofalas, tão divertida. E sobretudo, lembrei-me de como me senti   ao conhecer minha tia e descobrir nossas afinidades: o magistério, o gosto pelas letras, a dedicação maternal a sobrinhos. Lembrei dela contando de quando chegou a notícia de que minha mãe estava internada e desenganada pelos médicos. Seu relato do quanto todos choraram, da tristeza que sentiram ao pensarem que não mais a veriam. E não pude deixar de notar a cruel ironia no fato de que não apenas tornaram a ver minha mãe, como quis o destino que ela partisse primeiro, e com minha mãe mais próxima dela do que àquela época.
Lembrei-me dela me falando sobre suais ideias a respeito de casamento, e me confidenciando segredos. Éramos muito parecidas.
Havia tanto dela em mim. Havia tanto de mim nela.
E de repente, não havia mais nada.
Em um momento eu estava pesando todas as questões envolvendo minha possível ida ao Ceará em 2012. De um lado, meu desejo de rever Sobral, minha mãe, meus primos, toda aquela parte da minha história que eu só conhecia através dos relatos de minha mãe e depois, da única viagem ao local. E a alegria por rever essa pessoa tão querida, poder conversar com ela, contar das minhas incursões teatrais, das minhas experiências como professora aqui no Rio. Do outro lado, os "poréns", os "talvezes", os "mases" que poderiam inviabilizar a viagem. Mas era quase certo: eu iria revê-la em breve.
E no momento seguinte, só havia a saudade.
Será que ela sabia o quanto era importante para mim? O quanto eu me via nela?
E nesta hora, vem junto a culpa: eu poderia ter escrito só mais uma carta. Dado só mais um telefonema. Feito só mais uma viagem.
E de repente,já era tarde demais até para o último adeus.

*IN MEMORIAN-Tia Lúcia,minha amada tia,falecida em 23/10/11,dia do seu 55º aniversário,deixando um exemplo de vida batalhadora e digna.E muitas,muitas e infinitas saudades.

"É tão estranho: os bons morrem antes.
Me lembro de você,
E de tanta gente que se foi
Cedo demais."
(R.Russo)

"Não deixe nada pra depois
Não deixe o tempo passar
Não deixe nada pra semana que vem
Porque semana que vem pode nem chegar."
(P.Leone)

"É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã,
Porque se você parar pra pensar,
Na verdade,não há."
(R.Russo)






Um comentário:

  1. Do svjdania, Longa vida!
    Não há palavras que acalmem ou intenções que diminuam. Sofremos. Muito. E a dor não some com o tempo.
    Passamos a sentir falta daquela interação que havia tanto tempo. Sofremos de novo. Não só pelo que perdemos, mas pelo que ainda poderíamos ter.

    Lamento, amada amiga.

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